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terça-feira, 5 de junho de 2012

A última rima do padre Arsénio



(Foto retirada do site do Correio da Manhã)

Lá longe, sem o preito devido por cá, faleceu no passado dia 14 de maio, em Portimão, o padre Arsénio Castro da Silva, um famalicense que merece o reconhecimento da nossa comunidade. Tinha 73 anos e, ao que a imprensa e rádios algarvias informaram, só soçobrou quando a doença se tornou numa adversidade desigual. E definitiva, infelizmente.
Conheci-o ainda muito jovem, num encontro fortuito intermediado pelo pai - o popular Séninho, que os famalicenses com a vida meia vivida recordarão, seguramente, quer pela ocupação profissional, qual relações públicas da Fundação Cupertino de Miranda, quer pela multifacetada atividade que desenvolveu ao serviço da comunidade paroquial da cidade, a de Santo Adrião.
Mas, foi mais tarde, e já homem, que verdadeiramente o fiquei a conhecer. Pude usufruir da sua luminosa presença algarvia, como jornalista e conterrâneo meio perdido naquelas paragens, por duas ou três vezes. (A primeira, lembro-me bem, estava Artur Jorge a treinar a equipa de futebol do Portimonense, então na I Divisão. Com as dicas e uns telefonemas do padre Arsénio para um dirigente do clube, consegui fazer uma reportagem que me valeu, pela primeira vez, duas páginas, inteirinhas, no jornal onde então trabalhava. Entrevistei o renomado treinador e o malogrado Carlos Alhinho, entre outros cromos difíceis e aspirantes a craques, conseguindo decifrar o sucesso da equipa surpresa do futebol português de então: a mais genuína da camaradagem e uma cidade inteira a puxar pelos seus ídolos).
Aquele reencontro imprevisto foi o suficiente, no entanto, para um aceno de cumplicidade e simpatia sempre que, esporadicamente, por cá o revi. Encarnava, como poucos, a máxima “Quem não vive para servir não serve para viver”.
Sacerdote jesuíta, chegou, com a humildade dos Homens que nos preenchem a vida, a descarregar peixe na lota de Portimão para ajudar os outros e se realizar enquanto padre comprometido com os mais vulneráveis. Paralelamente ao seu mister sacerdotal, que o levou a várias paróquias algarvias, foi professor, orientou uma escola para crianças ciganas, fundou o Centro Social da Quinta do Amparo, em Portimão, e ajudou a criar uma rádio local, por cuja direção de programas se responsabilizou durante anos.
Em 11 de Abril de 1976, celebrou a primeira missa para a comunidade cristã que veio a justificar a criação da Paróquia de Nossa Senhora do Amparo, recorrendo, para o efeito, à adaptação de um espaço afeto a uma antiga fábrica de conservas de peixe. Nascia, assim, a “sala-capela” que foi semente de uma nova paróquia no Algarve.
Como filho de Famalicão e cidadão exemplar, merece o reconhecimento da autarquia e das gentes da nossa Terra – mesmo postumamente. Em 2008, atestando as suas raras qualidades humanas e fazendo realçar o polifacetado múnus a que o padre Arsénio Silva se entregou, como servidor da Igreja e do próximo, a Câmara de Portimão agraciou-o com a “Medalha de Mérito Municipal”. Vila Nova de Famalicão vai ficar insensível?
(Não nos despedimos, Padre Arsénio, mas que importa isso? Estou seguro que um dia haveremos de voltar a conversar sobre futebol, a Igreja dos mais pobres e, sobretudo, sobre o que é ser-se famalicense longe de Famalicão. Afinal, como um dia comentou comigo, Portimão até rima com Famalicão, não é? Esta foto, da autoria do fotojornalista Paulo Marcelino, encontrei-a no sítio do “Correio da Manhã”. Sabe qual é o título da notícia que ela ilustrava? “Morreu padre que dava de comer a pobres”. Agora, descanse em paz. Nossa Senhora do Amparo cuidará dos seus amigos de Portimão).
Carlos de Sousa

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